sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Perdido por cem, perdido por mil...

Um grande olá, depois desta ausência prolongada, mas repleta de coisas boas! :)

No entanto, sento-me ao computador para deixar aqui a minha indignação com o que ouvi esta tarde. 
Acabada de chegar de férias, fui até à casa dos meus sogros e estava a passar na televisão um daqueles programas de entretenimento (creio que na SIC), no qual aparecia uma senhora, que seria consultora de imagem ou stylist, suponho, a apresentar as tendências de moda para a próxima estação. A dada altura, chega a parte de falar do uso de pêlos (de animais), grande tendência do próximo Outono/Inverno. A apresentadora, e bem, refere a preferência pelo uso de sintéticos, em detrimento dos pêlos verdadeiros, cuja obtenção é feita às custas de uma verdadeira tortura para os animais. A senhora consultora/stylist/whatever, perde então uma grande oportunidade para ficar em silêncio, ao dizer algo do género: eu cá acho que já que os animais são sacrificados para serem comidos, também não faz mal serem sacrificados para o uso do seu pêlo ou pele. A apresentadora reiterou a sua posição, como lhe foi possível, because the show must go on, mas a senhora insistiu, pois se já estão mortos para serem comidos, que se aproveite o pêlo. Ora, e porque é que acho que foi perdida uma boa oportunidade de não fazer má figura? Vejamos:

1.º Os animais cujos pêlos são desejados pela indústria da moda/vestuário são capturados ou criados de formas cruéis e não, não são piedosamente postos num sono eterno para depois serem esfolados com toda a dignidade. Muitos são esfolados vivos ou moribundos e a sua captura pode significar dias de sofrimento presos na armadilha.

2.º A maior parte dos pêlos provêm de animais que não são aproveitados como alimento. A menos que seja vulgar comer martas, furões, chinchilas, raposas ou focas e eu não esteja a par da tendência...

3.º Mesmo no caso de peles derivadas de animais que são habitualmente consumidos como alimento, nem sempre a pele é aproveitada post mortem, sendo frequente que o processo de extracção da sua pele se inicie, mais uma vez, com estes animais vivos. Portanto, lá porque as vaquinhas são para comer, não quer dizer que tenham melhor sorte do que os amiguinhos peludos. Acho que a maioria das pessoas prefere acreditar nisto para manter a consciência tranquila.

4.º The last, but not the least: na minha opinião, ninguém deveria manifestar-se favorável ao sacrifício de animais para algo que não é essencial (nem para coisa nenhuma!), sobretudo de forma tão ligeira, como foi feito. 
Sei que pode parecer que estou a opor-me ao direito ao livre pensamento e à livre expressão, mas não se confundam as coisas, por favor. Para mim, é uma posição que está ao nível de tolerar violência doméstica ou outro tipo de abusos.

Porque sou amiga, vou poupar-vos mais pormenores, imagens, vídeos ou links sobre a obtenção de pêlos ou peles de animais.

A moda e a dignidade dos animais (e das pessoas) não andam propriamente de mãos dadas, mas as coisas não têm de continuar assim, pois há alternativas e essas alternativas deviam ser promovidas. Se a televisão, independentemente de se tratar de um canal público ou privado, aspira a prestar um verdadeiro serviço público, tem a obrigação de promovê-las. 
Tem a obrigação também de convidar pessoas mais informadas sobre as matérias que as próprias estão a tratar e, de preferência, um pouco mais à frente na visão que têm das coisas.

Para saber as próximas tendências de moda, basta abrir duas ou três revistas e ver uns quantos blogues, coordenar cores e texturas até pode ser um talento nato para alguns, mas isso não faz de ninguém um bom consultor de imagem, personal stylist ou afim. Como em qualquer profissão, há princípios que se têm ou não, e que vão pautar a postura assumida ao longo de uma carreira - chama-se ética e faz toda a diferença. Também como em qualquer profissão, a procura constante de conhecimento em diferentes áreas não só não faz mal nenhum, como até valoriza, abre horizontes, faz crescer. E evita o constrangimento que a ignorância pode causar.
Cenas como a que vi hoje só descredibilizam os profissionais destas áreas, dando força à ideia de que estão reservadas a pessoas fúteis, desinteressantes, desinteressadas e pouco dadas ao enriquecimento intelectual ou ao raciocínio. É triste, porque há pessoas a trabalhar em consultoria de imagem/styling que são bem interessantes, interessadas, cultas e inteligentes!

Não quero, contudo, arrasar a senhora, que nem sei como se chama sequer. Simplesmente discordo com a posição desta pessoa, com a divulgação de posições como a sua e acho trágico que, por aparente falta de informação, justifique a sua posição com argumentos que não correspondem à verdade. Acredito que esta pessoa não tenha mau fundo e que só desconheça a realidade desta indústria (embora a devesse conhecer minimamente) - daí a importância de promover as alternativas e alertar publicamente para algo que não está certo.

Prometo posts mais animados do que este nos próximos dias, mas não podia deixar passar isto!

Ana.

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